segunda-feira, 23 de julho de 2012

Guardião



Emanuel menino pescador, e criador de santos, sois, reis e homens, que se eternizam feito pedra e emoção, tornando-se reais como espelho da sua própria vida. Enfim, um escultor que pensa por meio de imagens, misturando pedra e realidade em arte.
Como o jovem Manolin amigo de Santiago do “Velho e o Mar” – Emanuel conviveu com um pescador de barbas longas como um profeta antigo, pele dourada do sol, o braço  amputado, resultado das batalhas com  peixes gigantes, e mestre na preparação de deliciosos escaldados de frutos do mar.
Vindo ninguém sabe de onde, surgiu do mar e logo se fez irmão, naquela aldeia de pescadores.
Falava com experiências da sorte, da sobrevivência, das tempestades, tubarões, de enormes ondas e até da doçura do nascer do sol perdido no horizonte todo azul, cortando céu e mar.
Por alguns anos ele transformou o cotidiano da aldeia. Mas o estranho homem, sem nome e sem um braço, sumiu de mar a fora, num dia qualquer, talvez atendendo ao chamado de alguma sereia solitária, quem sabe! Mas, deixou raízes na visão clara e emocionada do artista que recriou-o com seu cinzel amolado, quebrando em beleza, sem alterar o passado, a figura desse homem do mar e numa atitude de carinho reconstruiu o seu braço. Depois, batizou-o com o nome de Guardião e plantou-o numa beira de praia, onde recebia as homenagens de quem por lá passava. Numa noite de lua cheia, o mar estava brabo e uma enorme onda, mais uma vez, arrancou o braço de Guardião. Ninguém sabe dizer se por vingança ou mistério do mar.
Hoje Guardião mora numa casa bonita, protegido por outro Guardião , como diria Fernando Pessoa: “A mim ensinou-me tudo.
Ensinou-me a olhar para as cousas,
Aponta-me todas as cousas que há nas flores.
Mostra-me como as pedras são engraçadas
Quando a gente as tem na mão
E olha devagar para elas.”

terça-feira, 17 de julho de 2012

Linha ou reticência, eis a questão!


Dona Ritinha criou oito filhos e fazia crochê.  Na sua vida o crochê tomava um sentido filosófico e não apenas real. Enquanto tecia  ela rezava e transformava em rosas de crochê, ave-marias e pequenas jaculatórias, dependendo da forma ou dos arremates das toalhas, colchas ou chales. Um dia em tom de censura falou: “Os amores dessa menina são como crochê, ela termina mas aproveita a linha”. Essa linha, na realidade era só uma reticência. Ela não sabia a força da reticência no amor. No amor e na vida, as reticências são passos do pensamento que continua. Afinal de conta, o amor e a vida fazem parte do mesmo livro. E no mais, “cada qual que se avenha com seu pecado” como diria Dom Quixote.

P.S – Ah!  aquela lua esparramada no mar, se entregando e recebida como presente nos mistérios do amor, “onde as estrelas mentem luz, ó noite, única coisa do tamanho do universo, torna-me, corpo e alma, parte do teu corpo, que eu me perca em ser mera treva e me torne noite também...”