sábado, 8 de setembro de 2012

MARIO IVO: Meu anjo tagarela. Esta historia é um raio de sol vivo na minha vida, uma das coisas que fazem a vida valer a pena




Maria Emília
Maria Emília Wanderley sorri com os olhos. Abraça com os olhos. Afaga com os olhos. Mas não saberia dizer a cor dos olhos de Maria Emília. (Azuis? Verdes? Uma mistura dos dois?) Será porque – sorrisos, abraços, carinhos, não têm cor. Será porque – são simplesmente claros, transparentes, transbordam alegrias. Será porque – no fundo, no fundo deles, lá longe e ao alcance do interlocutor, repousam horizontes, planícies, chãs. Não é preciso olhar nos olhos de Maria Emília para descobrir como ela conquistou tanta gente no mundo dito literário, microcosmo da província com ares de constelação, entre infinitos amigos e ao menos dois companheiros de vida real – os poetas, de versos, de alma, de vida, de coração, Berilo Wanderley e Nilson Patriota. Os poetas se foram e Maria Emília ficou. Só? Jamais. Maria Emília não tem espírito de carpideira. Quando chora, chora só, e discretamente. (Posso estar a imaginar, ou a inventar, ou sei, mesmo, que importa?) Maria Emília tem, mais que a certeza, a clareza de ter vivido ao lado de pessoas memoráveis, que, como ela, não conquistaram apenas as tais caras-metades, mas uma legião de amizades sinceras e duradouras, de amores eternos enquanto duraram.
Foi por essa alegria – e por que não dizer? pelos seus lindos e belos olhos – que Maria Emília conseguiu concretizar o que parecia impossível: reunir, num só dia, hora e lugar, quase todos os poetas, cronistas, escritores e jornalistas de uma geração que entraria definitivamente para a história cultural desta província entre os anos 50 e 60, e cujo ápice coletivo se deu em 1961 através dos sete livros da Coleção Jorge Fernandes – Augusto Severo Neto, Celso da Silveira, Deífilo Gurgel, Dorian Gray, Luís Carlos Guimarães, Myriam Coeli e Sanderson Negreiros eram os “magnificent seven” de antão. Dos sete, apenas três restam vivos – mas todos os três estavam lá, terça-feira passada no Lula Restaurante, Morro Branco, quase esquina – vejam só – com a Rua da Saudade.
E não é excesso dizer que, em verdade, estavam todos lá, os vivos, os mortos, as companheiras, os amigos, uma Grande Família, enfim, o retrato de uma cidade que teima em resistir.
Todos reunidos em torno de Maria Emília e do homenageado principal, Berilo Wanderley, que teve o relançamento de sua estréia, “Telhado de sonho”, safra 56, presenteado a quem apareceu e sentou-se ao redor de uma grande mesa em formato de “U”, uma verdadeira antologia em carne e osso: Nei Leandro, Diva Cunha, Tarcísio Gurgel, Inácio Magalhães, Vicente Serejo, Woden Madruga, Paulinho de Tarso Correia de Melo, e os já citados Deífilo, Sanderson, Dorian, mais viúvas, mães, mulheres, musas.
As histórias remontavam meio século. Falavam de amor – uma ou outra pitada de ciúmes, claro –, falavam de paixão, resgatavam a boêmia, saudavam as letras.
Ninguém chorou. Todos sorriram.