quinta-feira, 12 de janeiro de 2012

SUÉCIA, inverno de 2012

”Meu coração tropical está coberto de neve” e toda esta visão de mundo também. Até o lago que conheci pelos meados de outubro, tão cristalino e arrodeado de margaridinhas, tulipas, orquídeas, morangos silvestres e cogumelos amarelados, que se Virginia Wolf, com suas pedrinhas no bolso, o tivesse escolhido, mudaria de idéia. Agora esta paisagem está muda e  afogada na neve. Mas a casa vermelha continua por lá. Vez por outra, vejo uma fumaça cinza  saindo da chaminé, sinal de vida naquela casa silenciosa. Me disseram que o dono é um homem só e cria um cachorro. Ele passa sempre aqui por perto, usando seu casaco vermelho até aos joelhos, deixando aparecer umas enormes botas pretas - a cabeça é protegida pelo um gorro de pele, acho que de raposa. O vermelho do casaco dá um colorido alegre na paisagem. Ontem consegui ver o rosto dele, e é parecido com aquele leãozinho simpático do Mágico de Oz. O cachorro que acompanha o homem tem um andar esquisito, quando pisa na neve, dá uns pulinhos que lembra os pulinhos de Maria Betânia no final de cada show.
A paisagem mais bonita é logo aqui em frente de casa: uma floresta de pinheiros, todos branquinhos, cobertos de neve. Imagine eu, que conheci a neve quando eu era menina, através da ornamentação de Natal  lá de casa. Minha mãe ornamentava a árvore com tiras de algodão, cortada com muito esmero para cada galhinho da árvore, e depois dizia: “- Aqui são neves!”, eu achava estranho, mas...em baixo da árvore ficava o menino Jesus, Maria e José. Tinha também uma vaquinha pintada de um branco desbotado. Mas o que eu achava bonitinho  era um espelho redondo com dois patinhos, como se fosse um lago – parecia o lago cristalino aqui das redondezas. Num certo Natal, minha mãe resolveu acender uma vela para o menino Jesus e foi aí que a coisa não deu certo: as neves de algodão pegaram fogo, e se meu pai não fosse tão ágil, trazendo uma lata d’água, a coisa seria pior. Até o peru natalino, com a barriga cheia de farofa e passas, perdeu a graça.
E aquele “abominável homem das neves”? Bem que me fascina! Abominável, nada – com aquele casaco vermelho! O vermelho é a cor do amor, quase a cor do pecado. Ele é mais,“comme le roi d’un pays pluvieux. Riche, mais impuissant”... ou será que é daqueles que diz,”- só amei uma vez na vida!” Cá para nós, quando alguém assegura que só amou uma vez na vida... juro que isso não é amor, e sim uma idéia fixa. Amor, é como  canta Carmen: “L´amour est un oiseau rebelle qui ne peut apprivoiser”. Sei não! Mas se não fosse  aquele  cachorrinho do andar ridículo, penso que eu teria coragem de pegar duas taças, um bom vinho tinto, e me protegeria do frio com um casaco de pele e um chapéu que encontrei aqui no armário –  Bené Chaves logo reconheceria, igual aquele que a sueca Greta Garbo usou no filme “Grande Hotel” -  e iria na casinha vermelha, bateria na porta, e com um sorriso meio desconfiado, diria: SKÅL!
Mas aqui dentro de casa, os 25 graus negativos lá de fora, perde toda força. A casa é povoada de ternura e amor, além dos pais, dois anjinhos belíssimos de olhos azuis e cabelos cheio de cachinhos- são dois sóis em minha vida! André Berilo tem quatro anos, contador de história por excelência, histórias de estrelinhas, dinossauros, gelo com gosto de peixe. E também canta, sempre as  músicas do seu próprio repertório, às vezes na sua própria língua. Maria Emilia tem seis anos. Ela é uma janela de doçura para o meu mundo. Durante esses dias acordava sempre ao som do “Eu te adoro” dela. E eles não sabem que em troca me dá tanta felicidade.

terça-feira, 3 de janeiro de 2012

E um dia contaremos esta estória...

Eles saíram em busca da estrela da manhã. “Onde está a estrela da manhã? Meus amigos, meus inimigos. Procurem a estrela da manhã.” No caminho ela ofereceu vinho servido nas conchas das mãos e correram para o mar com “mafuás, novenas cavalhadas, cheios de  ternura tão simples.” Era madrugada e a estrela ainda dormia. Saíram do mar correndo como pássaros molhados, e entraram num jeep que também fazia parte da busca à estrela da manhã. E então, ele “era o rei, era o bedel e era também juiz.” A brisa da madrugada, feito uma fada madrinha com carícias, secava os cabelos e as vestes encharcadas das ondas salgadas do mar.
Era manhã. Enlaçados num ritual de bodas vestiram camisas brancas. “E agora eu era um louco a perguntar o que é que a vida vai fazer de mim.”